Senhores, ronda entre nós um espírito maléfico. Um personagem esdrúxulo em cuja presença poucas coisas vivas resistiram. Um personagem que não se veste: enverga andrajos negros e torturados e tão tortuosos quanto as árvores do bioma cerradense que nos cerca.
Esse espectro tenebroso que destoa da massa vulgar e que circula furtivamente por esses corredores cinzentos reside na turma 1° A e perambula pelas manhãs do Centrão, onde aspirantes a burguesas e patricinhas ostentam vestes coloridas e espalhafatosas, trançando os braços em gigantescas correntes humanas tropeçantes e vacilantes que escondem a insegurança que lhes toma por completo, embora poucos o percebam. Caminha onde pseudo-roqueiros e pseudo-punks ostentam uma pseudoatitude acobertada por pichações vazias e anti-moda que na verdade vem a ser a moda que rola mas que não chega aos pés de um singelo chapéu de pescador tricotado que recobre o encéfalo obscuro e os olhos opacos e vagos deste espectro de pura maldade.
Pois este espectro aprontou das suas na última sexta feira, na mesma turma que carinhosamente o acolhera. Chegado há pouco do intervalo, um de seus colegas veio com a melhor das intenções desejar-lhe uma boa prova quando o mesmo saiu inesperadamente e com a frieza polar de um personagem encapuzado de filme-de-terror-besteirol-americano tipo D pronunciou as palavras cruéis que constituíam uma máxima de vida para este ser esdrúxulo. As palavras que vieram de forma arrastada e lenta e pesada foram as seguintes:
- Pois tomara que você morra.
Não se deu ao trabalho nem de colocar uma exclamação. Era tão fatalista e tão frio que as exclamações sumiram, desapareceram, escafederam, viraram alcanfor de sua gramática. O burburinho habitual da turma 1 ° A tornou-se um pesado e sepulcral silêncio que se estendeu e aprofundou-se conforme proliferava a peçonha do espectro. Até o aluno mais gaiato que havia naquela turma estremeceu e, compreensivelmente aterrorizado, disse:
- Não brinca com isso não, cara. Vai que ...
Em vez de terminar a frase, esboçou o sinal da cruz contra o peito enquanto seus lábios estremeciam.
Indiferente aos olhares atemorizados, o espectro maledicente sentou-se em uma das cadeiras, apoiando seus pés na carteira da frente, ao que a garota que sentava na mesma levantou-se amedrontada enquanto o ser maléfico, sem discrição nem escrúpulos, e com a naturalidade de quem deseja um bom-dia, disse ainda:
- Tomara que todos vocês morram.
Então o temor virou um terror incontido. O gaiato empalideceu. Sua barriga borbulhava, como acontece com certas pessoas em situações semelhantes. Um quase sorriso esboçou-se na quase face do proliferador do mal. Antes que R. André Carrasco chegasse com as provas a sala já se encontrava vazia.
Afora as conjecturas, o fato é que dizem que o número de alunos da turma 1° A vem diminuindo assustadoramente, mas os céticos preferem acreditar que o índice se deve a desistências, transferências e coisas dessa ordem. Mas são apenas números que bóiam a deriva no imenso mar das estatísticas.
De toda forma ... CUIDADO GAROTOS!!
Este espectro ainda ronda por esses corredores de cor cinza com apenas um desejo no coração: Que todos morram!!
Ele está entre nós e se você vir o seu vulto ou ouvir a sua voz, de nada adiantará recorrer à Igreja Universal ..
Seja no 1 ° H ou no 2° D, ninguém está a salvo da má sorte de cruzar com um sujeito portando chapéu de pescador e um sorriso irônico rastejando pelo Centrão...
By Devana Babu
“A Gazeta do Oprimido”, Ano I, # 02, outubro de 05.
0 Comentários