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Manifesto da Bagunça - Parte II

Sejamos, pois, breves: Os papéis que ficam de um lado e do outro, totalmente desordenados (não bagunçados) não são um simples amontoado de papeis, mas um método estudado com rigor científico que facilita em 100% a acessibilidade e a achabilidade de qualquer papel que você queira. Os livros no chão não te deixam perder o calor da pesquisa. Aquele pé de meia dependurada na cama promove um equilíbrio perfeito com aquela cueca pendurada num prego qualquer. As roupas desdobradas são fáceis de guardar e pegar, além do que elas sempre ficam desorganizadas por ordem de uso e refletem o seu estado emocional. E a ordem, além de medíocre, é hipócrita. A ordem camufla o seu verdadeiro eu. Não há nada mais revelador da alma humana. A bagunça... oops, desculpem, a organização excêntrica, é a alma humana! Mas, e o violão que sai de recônditos estranhos? Podem se perguntar alguns mais observadores. Simples: o processo de organização excêntrica ocorre com o decorrer do tempo. Não adianta tentar imitar ou reproduzir um ambiente excentricamente organizado. Primeiro porque sempre corre-se o risco - e certamente ocorrerá- de se criar certas estéticas que imitem os padrões organizacionais pré-estabelecidos pelo sistema e assim você terá uma bagunça organizada, o que não é bom. A verdadeira organização excêntrica é fruto da ordem natural do tempo e cada par de meia é um fato específico e especial que ocorreu. Cada mochila jogada displicentemente num canto é um sentimento duramente construído ao longo do tempo e tudo começa desde a primeira camisa que não se dobra. Desde o primeiro lençol que não se troca. Desde o primeiro tênis que não se lava à primeira bronca da mamãe. E o violão? Ah, o violão, bem... no começo o violão é posto num "lugar plausível", mas o processo de excentrização organizacional faz com que os outros objetos se apossem inadvertidamente daquele lugar, fazendo com que logo não se imagine como ele foi parar lá e quanto mais o seu violão se afoga nesse mar abjeto de objetos, mais você emerge das amarras do sistema e, logo, a bagunça passa a ser um retrato fiel da personalidade e da vida de um homem e uma grafia da história, que nenhum livro, nenhum filme, nenhuma canção jamais retrataria além de ser uma composição digna de uma bienal que nenhuma dessas modernosas instalações com acentos de duvidosa contemporaneidade superaria! Eu acredito, inclusive, que todo esse lero-lero padronizador é uma conspiração do vaticano para que as pessoas nunca evoluam. Para que a ordem faça elas se desconhecerem, pois já dizia a sentença na entrada do Templo de Delfos: Conhece-te a ti mesmo! e se amarrarem é, enfim, para que a ciência nunca evolua o bastante a ponto de as pessoas substituírem deus - essa poderosa máquina de caça-níqueis - pela razão e pelas máquinas. Então, a organização excêntrica é, sim, um meio de vida saudável e a sua renúncia é o grande e definitivo mal da humanidade. Portanto: Bagunceiros de todos os tempos uni-vos, amém!Altas da madruga tentando e não conseguindo acabar esse texto que começou de tardezinha e interrompeu-se inúmeras vezes...




Devana Babu



Escrito originalmente em http://devanababu.zip.net/ . Dezembro de 2005.

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