banner supernova

 

 

Hitler não morreu!



Ou Heil Heider!


O que é o que é?

Tem o cabelo lambido pro lado, mas não é emo.

Tem nome alemão, mas veio do interior.

Quer construir uma câmara de gás, mas não é nazista.

Paquera as alunas, mas não é jovem.

Quer registrar todo mundo, mas não é polícia civil.

Prega a disciplina, mas não é militar.

Parabéns para quem lembrou do Heider (leia-se Raider, como manda a pronuncia alemã) na hora. Pra quem ainda não adivinhou, pode procurar o ensino especial do Centrão, pois só pode ser deficiente.

Pois Heider é um iminente aspirante à Hitler tropical, à ariano tupiniquim. E muitos alunos do Centrão dão total apoio a sua filosofia anti-reprovista. Por esse motivo, nós criamos o P2H!doC, o Partido Heil Heider do Centrão. Nós acreditamos no seu projeto e acreditamos que ele será o líder supremo da revolução, que nós vamos fazer nesse colégio. Nós do P2H!doC vamos explicar passo a passo todas as manobras do führer pelo nosso colégio.

Senão, vejamos:

I – Heider. Seu nome é alemão, como já falamos 300 vezes, mas é sempre bom ressaltar. Ele quer dar uma de “eider”, mas no dia da grande revolução, nós do P2H!doC acreditamos que ele vai revelar ao mundo a sua identidade de “raider”.

II – Heider tem os olhos castanhos, os cabelos lisinhos e pintados com Grecin 5, mas escorregadios que sabonete melado no óleo. Se ele é emo ou não, não podemos saber. Mas ele lembra muito o adolfinho(hitler), com aquele olhar penetrante e carrasco, pronto para repreender qualquer abuso, e suas mãos sempre pra trás são um hábito que ele conserva de um chicote de domador que ele ganhou da namorada, Eva. Eva Braum. O P2H!doC já está providenciando camisetas com a estampa da sua silhueta em sombra e luz, igualzinha a do Adolf e a daquele comunista subversivo do Che Guevara.

III – Heider já chegou a declarar em sala de aula: “ano que vem estaremos construindo uma sala de aula só para os reprovados. Eu, pessoalmente, vou instalar uma tubulação de gás venenoso, e transformar a sala numa câmara de gás. Aí nós vamos matar todos os reprovados, e limpar o nosso colégio dessa raça impura que mancha a nossa história. O futuro colégio pertence aos CDFs, e só nós poderemos coexistir em um colégio ideal”. Eu, particularmente, senti um arrepio na espinhela. Aquilo era o próprio Hitler falando. Heider foi aclamado pelo P2H!doC, que acredita na limpeza racial do colégio.

IV – Heider, uma época dessas, estava tirando fotografias de todos os alunos, pegando seus nomes completos, turma e série. Nós do P2H!doC acreditamos que é o primeiro passo para a seleção dos alunos em reprovados, passados e recuperados, além dos dependentes. Só quem tiver passado direto em todos os anos teria direito ao espaço vital. Os demais alunos teriam que colocar Israel ou Sara antes do nome, e andar com uma faixa branca amarrada no braço.

V – Heider é um amante incondicional da disciplina. Ele faz discursos inflamados em sala de aula sempre que alguém interrompe a aula dele pra falar com alguém que não seja ele. Mesmo que a pessoa tenha dito: “me empresta sua borracha?”. O P2H!doC acha que o próximo passo de Heider é ordenar o uso de uniformes militares para os alunos, com cores diferentes para os reprovados e passados.

Pois é, galera, está se aproximando uma nova era, a era da limpeza escolar, em que as ervas daninhas não vão mais danificar a colheita, em que a sociedade escolar vai viver uma era de glória e esplendor, de alunos calados, obedientes, decoradores de toda a matéria estipulada, enfim, alunos perfeitos.

Está se aproximando a Era Heider.

PS.: corre o boato de que um aluno chamado D. Baboo tentou se filiar ao partido, pois tinha aspirações nazistas, mas foi rejeitado, pois descobriram que ele já teve a infelicidade de reprovar um ano, resolveu fundar o PVSno2C, o Partido Viva Sho no Colégio Centrão, uma alusão ao coreano que matou um monte de universitários na Virginia. Mas isso já é outra história...

***

CARTA ABERTA AO CONSELHO ESCOLAR DO CENTRO DE ENSINO MÉDIO 01 DE SÃO SEBASTIÃO


Em primeiro lugar, eu gostaria de pedir desculpas.

Mas pedir desculpas não por ter me expressado. Nem por ter atacado um comportamento que o meu espírito aponta como errado. Ou por ter exposto a carne de um professor ao açoite de uma discussão mais ampla sobre a sua conduta. Ou por ter atingido a moral de um magistrado. Não. Disso não me desculpo. Desculpo-me somente pela violência com que o fiz. Desculpo-me somente de ter disparado no corpo de um homem com o coração frágil o alarme de uma pressão alta, e de ter sido tão repentino na forma como fiz surgir o artigo que o satirizava.

Mas deve-se compreender também o que me levou a criar o artigo, e fazê-lo circular. E é preciso saber também que todos os fatos são verídicos, obviamente que sob uma ótica irônica, mas o conselho há de não ter problemas em distinguir o que é essência e o que é forma, qual é o fato e qual é a ironia, afinal, muitos dos professores que a compõem sabem fazer um uso perfeito dessa forma de linguagem.

A violência com que o texto trata a conduta do professor Heider é fruto de um histórico de repressão tanto da parte desse professor quanto de outros professores, que embora não escancarado é muito presente nas pequenas coisas cotidianas. Obviamente que não me refiro a todos os professores, mas a uma parte que infelizmente exerce uma maior influência sobre essa instituição, talvez por serem remanescentes de uma época mais antiga, e por quererem conservar o modelo de vida e de ensino a que estão acostumados.

E, de fato, num dado momento, o professor em questão se mostrou como o expoente mais claro dessa vertente. Pois ele apresentava uma série de características que permitiam fazer um raio-x mais compreensível dessa realidade.

O professor em questão demonstrava todas as premissas atribuídas aos déspotas que já aprontaram nesse mundo afora, é bem verdade que reduzidos a pátria do seu próprio colégio, onde era mister para ele manter a sua moral, a sua intocabilidade, a superioridade da sua experiência, a solidez da instituição. E toda vez que essa estabilidade é levemente ameaçada, ele se sente autorizado a agir com sua força dentro da instituição, a movimentar as engrenagens discretas que movimentando outras engrenagens, apertam um pouco os focos dessa instabilidade, “consertam o defeito do relógio” , e fazem as pequeninas engrenagens girarem quietinhas no seu eixo egocêntrico.

Notem que essa não é uma característica exclusivamente desse professor, mas que essas eram características mais evidentes nele, e que tinham, senão um conteúdo, um invólucro muito mais comparável aos momentos históricos em que diversas pátrias foram assoladas pelo despotismo, como a própria pátria alemã. Vejamos:

· Heider disse, sim, na sala de aula em que eu estudo, e há testemunhas, logo nos primeiros dias de aula, exatamente nesses termos, a declaração estúpida e até mesmo preconceituosa: “ano que vem, vai haver uma sala só de reprovados. Nós vamos instalar uma tubulação de gás venenoso, e a transformaremos numa câmara de gás”. Acho que essa frase dispensa qualquer comentário, e foi o que começou a despertar em nós as maldosas comparações.

· O professor Heider cobrava de nós um disciplina praticamente militar, ressalte-se o fato de que o professor heider já foi de fato militar. Mas nosso colégio não é militar, e nem nós estamos aqui para aprendermos a obediência. E se ele queria a obediência, não deveria ter escolhido a matéria de sociologia para ensinar. A cobrança insistente das carteiras perfeitamente organizadas, o silêncio absoluto. Silêncio é uma coisa que os professores prezam, o que é natural em quem fala em público, ou para uma turma, mas esse silêncio se dá na devida proporção. Mas no caso do professor Heider, isso era transformado numa quase religião, num dogma. Gentileza era uma coisa que ele não conhecia. Ele exigia a resposta imediata ao seu desejo. Ninguém podia sentar no fundo das salas, pois ele disse que aqueles que no fundo estivessem estariam reprovados. E é claro que ele tem poder para fazer isso, pois ele disse que seu sistema de avaliação é a “observação direta”. Notem novamente que a questão aqui não é o ato em si, mas a forma como se dá, os aspectos que envolvem o fato em sala de aula. É claro que ele pode querer a nossa atenção quando explica alguma matéria relacionada ao conteúdo, mas o burburinho em si faz parte da dinâmica das aulas. O jeito autoritário com que exigia essa disciplina, a sua postura despótica, o olhar censurador, os discursos que fazia quando achava que a disciplina não era respeitada, esse modo de lidar que ele tinha influenciaram também esse pensamento de comparação em nós.

· O professor Heider nos falava muito de leis e nos ensinava a Constituição. Mas na maioria das vezes aproveitava para comentar como nós estávamos vinculados ao poder do Estado, e de como ele, como professor, era um representante desse poder, e como nós o devíamos obediência, e como a máquina do Estado era capaz de punir aqueles que o afrontassem. Como quando ele disse isso: “eu sei exatamente como atropelar a vida de um aluno. Se eu faço uma denúncia, simplesmente mando preso. E eu não tenho dó não”. Ele já demonstrou mesmo que não tem dó, pois já ameaçou alguns alunos.

· Ele também nunca foi aberto à discussão. Ele reprimia mesmo algumas pessoas que tentavam argumentar com ele, e isso é relatado por pessoas de outras salas. Ou simplesmente ignora os que tentam suscitar alguma discussão que o desagrada. É o meu caso, pois eu sempre fui ignorado por ele em sala de aula. Levantando a mão, chamando, comentando, ele fingia que não ouvia.

Ou seja, o professor Heider sempre nos inspirou a obediência, e, eu diria até, o medo. O medo da reprimenda. O medo de não cumprir a sua cota bimestral por qualquer motivo. O medo de ser punido pelo sistema. O medo de estar certo. Medos que sempre acompanharam a vida dos alunos, e que esse professor incorporou de uma forma bem desconfortante para nós.

Além de outras condutas que esse professor mantinha, como o despudor com que ele se referia às alunas, isso em várias turmas. Coisas obscenas que ele dizia, como para a minha colega, a quem ele disse: “quase que você queimou a sua preciosa, hein?” comentando um dia em que essa colega sentou numa cadeira com Super-Bonder. Esse tipo de coisa se repete em varias outras salas.

Esses comportamentos, observados em várias classes, causaram essa impressão de autoritarismo, essa comparação medonha com essa mancha negra da história que foi o nacional socialismo alemão. E como eu dizia, toda a carga de outros comportamentos semelhantes, porém mais espaciais, sofridas no colégio, por mim, por colegas, por gente que nem estuda mais, acarretou esse sentimento de revolta, de superação da impotência que sentíamos, proporcional a potência dos professores, que levou a confecção desse artigo em questão, e que levaram ao apoio dos meus colegas, e que levaram os poucos exemplares desse jornal a circularem, com toda a comparação e ironia que continha.

Como o próprio Heider disse, “o nazismo morreu no século passado”. Ou não, né?

Devana Babu

Postar um comentário

0 Comentários