Vc pisou meu coração
com o seu negro coturno
e com seu spike soturno
dilacerou minha carne
vc usou do meu sangue
para tingir seu cabelo
com esse rubro vermelho
como o sol daquela tarde
você deixou prensadas em minha epiderme
as marcas das bestas cruéis
dos seus barrocos anéis
como quem esmaga um verme
com suas correntes de cachorro
vc prendeu a minha alma
e observou-me minúsculo na palma
da sua mão e eu gritava por socorro.
vc me deixou afogar
na vodca de tua coca-cola
e quando vc vomitou na escola
eu saí junto com seu gofo a me atolar
vc me fita com seus olhos verdes
e com seus lábios finos engole meus lábios
minha prisão já não vejo e já não vedes
que juntos mandamos que tudo vá pros diabos!
Espero uma visita
E penso que ela não existe
Morro eu de medo dela
Mas a espera em mim resiste
Nos cantos escuros
As ruas desertas
As noites solitárias
As portas abertas
Os barulhos indiscretos
Lá no fundo do quintal
O banheiro, alta noite
O formato anormal
Tenho medo: mas espero
Sinto que vem – penso que não
Há um paradoxo – há um contraste
Entre meus sentidos – e minha razão
Meus sentidos? Que sentidos?
Raramente eu uso isso
Mas é que é tão peculiar
Os calafrios, os arrepios
Tenho medo: mas espero
Mas se me afronto: me desespero
O que abomino: o que quero
Pois tenho medo do que espero
Você é linda.
Mas não linda como o sol resplandecente das manhãs
Nem como as pétalas da rosa.
Nem tão pouco como o mineral precioso
Vê é linda, sim, como uma lua
Branca, quase pálida, melancólica e solitária
Você é linda
Como o sangue que escorre das virgens e dos escravos
Que pendiam do crucifixo
Vc é linda
Como a carne que é dilacerada no IML
Vc é linda
Como os espinhos da rosa, cravados em meus dedos
Vc é linda
Como o uivar de um lobo na noite soturna
Vc é linda
Como o olho que eu não tenho
Vc é linda
Como um cadáver pendente da forca
Vc é linda
Como a fogueira consumindo as bruxas
Vc é linda
Como uma caixa craniana aberta
Vc é linda
Como uma genitália mergulhada num frasco de formol
Vc é linda
Como um gato preto andando no meu muro
Vc é linda
Como o empalado trespassado pela estaca
Vc é linda
Como um feto enforcado pelo cordão umbilical
Mas não. Vc não é bonita como a rosa, nem como a pedra preciosa, nem tampouco como o sol.
Juuuuuuuuuunta uma fome
Descomunal
Com minha vontade de comer
E minha superpopulação
Hormonal
E a ânsia em me comprazer
E esses apelos protuberantes
E esses sorrisos fosforescentes
E esses apitos irritantes
E essa espera pelo sinal verde em
Frente
E a vontade de avançar –
Agora que o sinal tá amarelo –
E a prudência quase medo de levar
Uma multa ou de levar um gelo
Devana Babu
“Radical News”, março de 2007, p. 6.
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