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De Quem é a Culpa?


Por Nanah Farias


Fico indignada com algumas coisas que tenho visto no mundo escolar. Não posso fazer muita coisa. Então resolvi desabafar aqui. Talvez alguns leitores achem que é um assunto chato, mas a coisa é preocupante.

Ouço muito a frase, "Programa de Governo para Escolas Públicas”. Ah, foi criado mais um? Mas, e aí? Como isso deve ser trabalhado? De que forma? Com quem isso vai ser trabalhado? Onde isso vai ser trabalhado?

Estou trabalhando juntamente com alguns amigos da SuperNova com um programa chamado ”Educação Integral”, onde o aluno passa o dia todo na escola. São crianças entre 9 e 11 anos. O meu trabalho é ministrar oficina de cineclube, mas dentro da atividade também fazemos leitura com todas as crianças inscritas.

Trata-se de uma boa ideia. Os alunos teriam atividades o dia inteiro, sendo que no contraturno receberiam atividades mais lúdicas. Mas as dificuldades são inúmeras e só estando no dia a dia, dentro da escola, para entender a complexidade dessa realidade. Para começar, apesar de ser bonita e arrumada, não há estrutura para comportar tantas crianças no mesmo horário, pois as salas estão cheias dos estudantes do turno normal. Então como abrigar os que são do outro turno? Como as salas estão ocupadas, a que usamos é menor que as normais, onde não há projetor, telão e a televisão que posso usar é de 14 polegadas, presa em uma grade que atrapalha a visão lateral. Agora pegue esse menino e ponha ele durante duas horas assistindo a um filme sentado numa mesma cadeira dura onde ele já passou cinco horas em aula normal e, depois, me conte!


No nosso caso, temos que dar aula em salas repletas de material que nada tem a ver com a nossa atividade.
 
É como o futsal, outra atividade desenvolvida no programa de horário integral, que tem necessidade de usar a quadra da escola, mas é raro o momento em que essa mesma quadra está vazia, pois os alunos do turno normal estão sempre a usando, seja para suas aulas práticas ou mesmo para a recreação. Com todas essas dificuldades, algumas crianças que parecem interessadas, acabam percebendo que assim não tem graça e logo perdem o interesse.

Conto com a ajuda da Direção e a boa vontade dos professores, mas há sérios problemas de infraestrutura, leia-se espaço físico, material de consumo e permanente, material de expediente.

Devo dizer que em termos de alimentação o programa está de parabéns, ainda que o café da manhã seja um tanto repetitivo.


Alguns educadores até poderiam fazer um trabalho melhor. Mas eles também não parecem preparados, porque ou não enxergam o caos ou se fingem de cegos. Então há um problema em quaisquer dos casos. É como se gastassem o tempo tentando cumprir o conteúdo do ano letivo e não sobrasse para ensinar outras coisas que considero tão importantes quanto.

No momento em que escrevo esse texto, estou ouvindo no noticiário da tevê uma notícia que me chamou a atenção. Parece coincidência. É sobre o ensino nas escolas públicas no Nordeste, precisamente no Ceará. Estão dizendo que lá as crianças querem muito estudar, mas o acesso à escola é quase impossível. Parece ironia que nós, morando na capital do Brasil - mesmo na periferia, não temos o mesmo grau de dificuldade para fazer nossas crianças chegarem à escola, mas a maioria delas não parece estar tão interessada como os garotos cearenses estão. O que faz com que o ensino nas escolas públicas continue assim? Os alunos precisam não apenas de informação, que já é precária, mesmo na Capital, mas de formação. A maioria dos alunos com quem convivo na Educação Integral não sabe ler! Estão entre 9 e 11 anos e não sabem ler. Estão na 3ª e 4ª série e não sabem ler! Não posso fechar os olhos e fingir que está tudo bem enquanto não se toma nenhuma providência. A precariedade de educação é tão fora do tolerável que me assusta. O que faz com que seja assim? De quem é a culpa? Da família? Dos educadores? Dos governantes? Da polícia? Da igreja? Da Dilma? Talvez seja do País inteiro. Talvez seja de cada um de nós!

Apesar disso, meus companheiros e eu estamos gostando de fazer esse trabalho. Está sendo uma experiência boa trabalhar e contribuir um pouco para a melhoria da qualidade de vida da minha comunidade.

Revisão: Daniel

Originalmente publicado no Blog da Nanah Farias. Disponível em http://blogdananahfarias.blogspot.com/2011/05/de-quem-e-culpa.html. Em 19/05/2011.

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2 Comentários

  1. Coincidências não existem, mamãe.

    muito bom o texto.

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  2. Nanah Farias, humanista por vocação e doutorada em sociologia e pedagogia pela faculdade da vida,
    Primor de texto Nanah, conteúdo fundamentado na pratica.

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