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Contagiando no forró

Ou: A maior banda underground de São Sebastião



Para início de conversa, vamos fixar o conceito de underground. Consultemos, digamos, o dicionário de inglês-português da enciclopédia britânica brasileira Barsa e eis:

UNDERGROUND. I s. subsolo; subterrâneo; ferrovia subterrânea, (ingl.) metrô (abrev. de u. railway; (polít.) organização secreta (esp. de resistência a invasor, ger. Acompanhado de the). II. Subterrâneo, secreto, oculto.

Under quer dizer sob, abaixo

Ground quer dizer chão, solo.

Então acho que já temos subsídios suficientes para definir o nosso conceito de underground. O underground é algo que está abaixo do solo, escondido nos subterrâneos, ou melhor, abaixo da superfície.

Transferindo isso para o mundo musical e fonográfico, podemos deduzir que o que está na superfície, então, é a chamada música pop, a música aprovada pelas grandes gravadoras e acatada pelas rádios. A música produzida com muita grana. A música produzida por muita gente. A música produzida para muita gente.

Por conseqüência, o underground é uma música alternativa, uma música produzida pelos meios próprios, divulgada por meios igualmente próprios, sem muitos recursos. Uma música que não é aprovada pelas grandes gravadoras nem tampouco acatada pelas grandes rádios. O maior exemplo do underground mundial chamou-se movimento punk. Surgido no final da década de 70, o movimento punk protagonizou uma verdadeira revolução no mundo da música, pois os caras descobriram que não só músicos profissionais poderiam tocar instrumentos musicais e montar uma banda. A partir de bandas como The Clash e Sex Pistols, e mais a frente os Ramones, nos Estados Unidos, começaram a surgir muitas bandas independentes que não estavam nem aí pra mídia. Na falta do que fazer na nossa quebrada começamos a realizar um levantamento das bandas underground da cidade de São Sebastião, periferia de Brasília, Distrito Federal, onde, por acaso, moramos. E acabamos por descobrir que existe uma banda originária de Uruana, Minas Gerais, que, migrando para Brasília, veio parar em São Sebastião, no Distrito Federal, e que a cidade adotou de coração. É claro que estamos falando dos Feras do Baile.

Os Feras do Baile gravam, produzem e distribuem os seus próprios CDs. Para tanto, se beneficiam da pirataria, da distribuição gratuita, das regravações caseiras e dos CDs que passam de mãos em mãos.

O que isso lembra? O copyleft, é claro.

Os Feras do Baile não tem dinheiro para pagar jabás, não tem acesso às grandes rádios e muito menos às grandes gravadoras mas se divulgam através das rádios comunitárias (leia-se piratas), de vizinhos chatos que ligam o som dos carros a toda altura tocando suas músicas, e da distribuição de CDs na porta dos shows.

O que isso lembra? Mídia independente.

Os Feras do Baile usam sempre os mesmos acordes, três ou quatro no máximo, com letras diretas e debochadas, sem floreios, performances esquizofrênicas e muita simplicidade.

O que isso lembra? (Que Deus me perdoe...) Lembra o movimento punk.

É o próprio do it yourself em ação.
***
A banda ainda continua com os mesmos ideais de trinta anos atrás. Com um trabalho totalmente independente, longe de aparecer em televisão, produz sua própria mídia. Grava os próprios CDs e DVDs e mesmo assim tem um público grande e fiel. Um público, aliás, formado pelas classes menos favorecidas da sociedade, formada por pedreiros, jardineiros, operários, domésticas, caseiros, copeiros e tantos outros profissionais desse naipe que, morando em São Sebastião, serve diariamente à burguesia que habita os palacetes do Lago Sul, pedaço de terra mais caro do Brasil e que fica 25 km de nossa cidade, denotando de forma imbusbebável o abismo social que assola a sociedade brasileira, mas isso não vem ao caso agora.

O que importa é que o visual da banda é totalmente agressivo e contraditório aos padrões de beleza exigidos pela sociedade, pois uns caras feios daqueles não poderiam estar mesmo dentro do perfil de beleza exigidos pela mídia e pela sociedade.

As músicas são formadas por acordes simples, com a bateria sempre no mesmo ritmo e feitas em cima dos três velhos acordes que os punks usavam naqueles tempos, com a diferença de que agora os sintetizadores tocam metade da música. Com pouca ou nenhuma formação musical eles mesmo assim conseguem agradar a todo mundo com seu ritmo “contagiante”. Enfim, eles são ou não são punks, são ou não são os legítimos undergrounds?

Então só me resta concluir que Os Feras do Baile são os legítimos representantes do UNDERGROUND em São Sebastião e quiçá no Distrito Federal. Eles estão mesmo contagiando no forró.


Devana Baboo
Chyko Batera

“Radical News”, julho de 2007, p. 6.

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